Capacitismo e ausência de vida afetiva ainda estão entre os estigmas mais comuns no dia a dia de PCDs
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Ao longo do ano, várias datas e campanhas nos conscientizam sobre a importância da inclusão de pessoas com deficiência, entre elas o dia 3 de dezembro – Dia Internacional das Pessoas com Deficiência. As pessoas com deficiência (PCDs) já são mais de 45 milhões no Brasil, segundo dados do IBGE, e apesar dos avanços, o grupo ainda enfrenta o descumprimento de leis e mitos relacionados aos seus comportamentos e capacidades.
O professor e advogado Dr. Orlando Narvaes de Campos é especialista na área dos direitos de pessoas com deficiência e sente o desafio de ser PCD em uma cidade urbana. Campos vive na região do ABC Paulista – SP, tem deficiência visual, é Mestre em Direito da Saúde e autor do livro “O Descumprimento dos Preceitos Legais na Área da Saúde em Relação às Pessoas com Deficiência” – (Paco Editorial).
Dr. Orlando Campos concedeu uma entrevista para o blog e conversamos a respeito dos mitos mais comuns sobre comportamento de PCDs e que valem ser repensados não somente hoje, mas todos os dias. Confira:
1. Falta de capacidade
No livro, Campos comenta que desde a Antiguidade as pessoas com deficiência foram excluídas do campo social por suas características serem consideradas “fora do padrão”, um dos fatores que auxiliaram para que certos estigmas fossem repassados a outras gerações.
Com a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, em vigor desde 2015, a sociedade e as organizações passaram a dar mais abertura para PCDs na Educação, no campo profissional, mas ainda há muito a ser melhorado, incluindo o problema do capacitismo – quando elas são tratadas com preconceito sobre sua capacidade para realizar atividades.
2. Falta de autonomia
Outro mito comum sobre pessoas com deficiência é sobre a autonomia delas para fazer coisas corriqueiras no dia a dia, como esportes, cozinhar, viajar. Embora o movimento de atletas e profissionais PCDs em diversas áreas esteja crescendo, muitas delas ainda sofrem com dúvidas e questionamentos sobre estas atividades e suas qualificações.
Além das atividades profissionais, Dr. Orlando Campos, treina jiu-jitsu. Foto: arquivo pessoal
“É importante lembrar que nós temos diversos tipos de deficiência. Infelizmente, nem sempre é possível uma pessoa com um tipo de deficiência em um grau mais avançado desenvolver mais autonomia, mas isto não tira o direito que ela receba um tratamento adequado para melhorar sua qualidade de vida nas instituições que temos no Brasil“.
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3. Pessoas com deficiência e o mercado de trabalho
PCDs ainda ocupam uma margem menor no mercado de trabalho e boa parte das empresas não conseguem atingir o que a Lei nº 8.213/1991 determina para empresas com mais de 100 funcionários, que é ter entre 2% a 5% de profissionais PCDs entre os colaboradores.
Porém, o grupo ainda enfrenta dificuldade seja pelo capacitismo, seja pela falta de preparo das empresas para incluir estas pessoas com o respeito que merecem. “Nós ainda dependemos de uma cota para que a lei seja cumprida, sendo que é perfeitamente possível exercer cargos em diversas áreas como engenharia, advocacia“, diz Campos.
Conforme estudo de Diversidade, Representatividade e Percepção – Censo Multissetorial da Gestão Kairós 2022, realizado com mais de 26 mil pessoas que trabalham em grandes organizações, somente 2,7% fazem parte do quadro funcional de empresas.
Segundo estudo seria necessário ter no mínimo 5% de PCDs em cada uma delas, portanto é importante que as empresas aprofundem sua visão e contratem especialistas em processos seletivos voltados a este grupo.
“Na cultura, por exemplo, há excelentes atores que têm deficiência e nem sempre são chamados para atuar em novelas e séries nas quais o papel seria para interpretar um PCD, ou seja, de algo que eles vivem e poderiam contribuir“, completa.
4. Estigma com a vida afetiva e sexual
Ainda existe uma visão social distorcida de que PCDs não têm uma vida afetiva e sexual ativas, o que é um estigma. Pessoas que não tenham deficiências mais graves podem criar laços afetivos e inclusive desenvolver outras habilidades nas relações sexuais.
No caso da deficiência visual, por exemplo, Orlando Campos comenta que uma pessoa pode desenvolver outros sentidos de forma mais aguçada, como o tato e o olfato. “A sexualidade é muito mental, claro que o corpo também ajuda, mas estar bem com a nossa mente é fundamental“, completa.
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5. Falta de compreensão e empatia
Ainda há uma falta de entendimento e empatia sobre a própria visão do que é ser PCD, pois nem sempre pessoas nascem com uma deficiência, mas podem vir a ter devido a alguma fatalidade em suas vidas, sendo importante que todos olhem para a acessibilidade como algo social e não apenas para determinados grupos.
“A deficiência não é só congênita, qualquer pessoa pode se tornar PCD, devido a um acidente ou doenças graves como um AVC. Ainda falta esta visão mais empática de que a deficiência é uma questão a ser debatida por todos e que as pessoas podem ser tratadas como pessoas normais, mesmo com suas limitações“, afirma Campos.
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6. A tecnologia não é sempre inclusiva
A tecnologia ainda não é totalmente inclusiva para as pessoas com deficiência. Embora já existam avanços na área de educação e entretenimento que incluem que os espaços tornem o estudo e a cultura acessíveis às PCDs, elas podem passar por situações que podem dificultar a acessibilidade, devido aos sistemas que estão colocados.
“Busco me especializar com frequência e já desisti de uma pós-graduação por que o sistema que foi colocado não era compatível com meu leitor de tela. Por não conseguir acompanhar as aulas sozinho, não consegui concluir o curso. Isso é complicado porque tira a autonomia da pessoa com deficiência“, comenta.
Dr. Campos também ressalta que estas situações podem ocorrer em atividades que parecem ser simples, como nas máquinas de autoatendimento em fastfoods, que são otimizadas, mas ainda não incluem a questão da autonomia, quando o assunto é acessibilidade.
K.C
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